outubro 24, 2012

Novelas? Blargh!


Aproveito o comentário que fiz em uma discussão pra refletir sobre os motivos por que ser contra (ou a favor) das novelas:

Entendo a motivação mais comum, e concordo: sim, a tevê é responsável por disseminar muitos valores incorretos que muitas vezes acabamos incorporando, e sim, nós como cristãos temos que ser diferentes e nos posicionarmos contra tudo isso. Por outro lado, escolher um tipo de entretenimento pra proibir, acho questionável. Como ser contra "novelas", por exemplo.
Qual é nosso argumento?

1. É porque possui cenas que mostram atitudes incorretas, personagens com valores errados, fazendo coisas que não concordamos? O último filme que você foi ver no cinema não tinha a mesma coisa? O seriado que você assiste não tem o mesmo conteúdo? O gibi que você lê, ou lia na adolescência, não tem as mesmas traições, adultérios, roubos, mortes, sensualidade, violência, desrespeito a pai e mãe, mentiras, destruição de famílias, …,? Ou esses outros produtos são inofensivos porque são em inglês, produzidos por alguém famoso e tem uma cara mais cult, modernosa? A música que eu estou cantando ou dançando não faz apologia a traição e não banaliza os relacionamentos saudáveis que Deus aprova? Ou essa música também está em inglês e não tem problema, porque "só tô curtindo o som"? A lascívia de uma novela é pior que a de Jorge Amado? A violência de uma novela (se houver), é pior do que a violência gratuita de Jogos Mortais, Laranja Mecânica, Sin City, Counter-Strike? As curvas da Isis Valverde são menos cinematográficas do que as da Angelina Jolie? O conteúdo espírita de uma novela são mais graves que as experiências sobrenaturais dos filmes de terror e exorcismo? Os distúrbios de relacionamento e os valores errados de uma novela são piores do que aqueles na obra do gênio Woody Allen, ou de tantos outros grandes da literatura, cinema, poesia, pintura? Porque um pode e o outro não?

2. Ou no fundo somos contra porque é popular? "Fez muito sucesso, logo deve estar errado"; "é da Globo, é lixo". Tem linguagem chula? Mostra o lado "devasso" do povo brasileiro? Frases como "lá fora é que tem cultura de verdade" não fazem sentido. Achar que a sociedade brasileira é pior que as outras é muita ingenuidade. O Brasil é muito rico em sua cultura, e as novelas, boas ou ruins, tem sido uma forma de transmitir e preservar isso, além de ser um meio muito acessível. Imagino que quem estuda cinema deve reconhecer nas novelas um valor artístico muito grande, pois são construídas de uma forma bem peculiar em questão de roteiro, cenas, linguagem, que cumpre com sucesso a tarefa de manter as pessoas interessadas em uma história que acontece diariamente. Poucos conseguem fazer isso. Tanto é, que as nossas novelas são exportadas pra tudo que é lugar. Então, se somos contra a novela porque é artisticamente pobre, temos que escolher outro argumento. Porque filme, série, livro, gibi, música seriam formas "dignas" de entretenimento e a novela não? É mais um formato de contar história, como todos os outros.

3. Não vim defender a novela, só defendo que a gente avalie os conteúdos pra separar o bom do ruim, e não empacote um gênero inteiro como proibido, simplesmente "porque sim". Se for assim, é como dizer "não escute música", ao invés de "não escute música inadequada". Pessoalmente, não assisto novela porque não sou muito fã de tv em geral (tá bom, confesso, assisti Luz Clarita ¬¬), mas penso que existam novelas boas e ruins, com conteúdos adequados e inadequados. Como cristãos, temos que ser bons filtros pra separar aquilo que nos alimenta; e de preferência, devemos usar a mesma régua para medir todas as coisas. Por isso me preocupo com o "argumento".

4. (Esse é só pra polemizar :P) Será que tudo o que eu vejo se torna parte de mim? O fato de eu assistir alguém mentindo me dá vontade de mentir, ou faz a mentira se tornar menos grave e mais natural? Se sim, então devo parar. Preciso investigar meu coração pra saber minhas reais motivações. E não adianta tentar enganar a mim mesmo: "Ai, estou assistindo esse reality-show só pra analisar o comportamento das pessoas"; é isso mesmo? Concordo, tem coisas em si que não tem conteúdo construtivo nenhum e em nada edificam. Pra essas coisas é melhor ir lá fora ver a grama crescer. Mas e o que fica no meio termo? Será que eu ver uma cena de um crime, onde pessoas são mortas após o mocinho cometer um adultério, é a mesma coisa do que eu ver um filme de violência explícita por 1h? Eu gosto muito de filmes, principalmente os de não-ficção, dramas, filmes com bastante diálogo, e bastante vida real. E normalmente, pra uma história ser boa, aquela que te mantém sentado por duas horas, ela tem algum problema, um conflito a ser resolvido. E muitas delas (todas?) envolvem vários pecados ou fraquezas humanas no decorrer do filme. Fico imaginando como seria relatar uma história sobre humanos, sem que aparecesse alguma podridão. (a bíblia mesmo tem histórias mais cabeludas e terríveis do que as de muito filme por aí). Como fazemos? Deixamos de ver e participar de tudo que contenha "o mal"? Poderemos sair na rua? Essas coisas não estão só nos filmes. Aí a pergunta é mais complexa. Não sei a resposta. Acho que temos que estar sempre filtrando, e pensando: isso é um bom alimento? Paulo foi muito sábio falando sobre nossa liberdade: "…nem tudo me convém". Mas, como tudo que não tem regras definidas, deixa as coisas mais difíceis. Temos que pensar mais pra saber o que pode e o que não :)



RESUMO:
- "Não assista novela porque você poderia estar lendo a bíblia ou visitando alguém ou doando sangue". OK
- "Não assista novela porque sua família precisa de mais papo e menos tevê". Ótimo.
- "Não assista novela porque tem traição". Tudo bem, mas seja consistente e se prepare para sair do cinema quando ocorrer a mesma situação, ou para largar o seriado ou livro que você tanto gosta, mas que tem os mesmos conceitos errados, travestidos numa forma mais "culta" ou "artística".

Temos que ensinar nossas crianças e jovens a crescer sabendo analisar as coisas e discernir entre o que é bom ou ruim, e porquê. Não adianta ser contra determinada coisa, simplesmente. "Não veja isso", "Não leia esse livro", "Não vote naquele partido", … acaba sendo muito simplista, principalmente porque a sociedade está cada vez mais complexa, e se queremos nos comunicar com ela, temos que fazer análises menos superficiais. Do contrário, vamos cultivar pessoas que, não convencidas pelo "não pode", fazem todas essas coisas "proibidas" e vão continuar fazendo, mas em silêncio (não vão contar na nossa frente), porque eliminamos o diálogo ao dizermos "Não" sem argumentos consistentes ou que não se reflete com coerência nas nossas atitudes. E um jovem (adulto?, adolescente?) que faz/não faz determinada coisa e não tem convicções ou fundamentos consistentes do porquê, está pronto para cair na primeira confrontação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário